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Histórias de Minas

 

No dia 5 de setembro de 1933, ele apareceu morto dentro da banheira do palácio da Liberdade, em Belo Horizonte. “Era celibatário” (78 anos, nasceu em 1855), diz o Dicionário Biográfico de Minas Gerais, edição da Universidade Federal e da Assembleia Legislativa de Minas.
Olegário Maciel é o patrono dos vices. Dos vices que dão certo. Deputado de 1880 a 1911, abandonou a política e voltou a ser fazendeiro. Em 1922, foi chamado para vice-presidente do Estado, com o “presidente” (governador) Raul Soares. Raul Soares adoeceu de 1923 a 1924, ele assumiu. Raul Soares morreu em 1924, ele assumiu de novo.
Fernando de Mello Viana foi eleito para completar o quatriênio, mas foi escolhido vice de Washington Luiz Maciel cumpriu o resto do mandato. Em 30, torna-se “presidente” (governador) de Minas, vem a “revolução” de 30, Getúlio o confirma interventor e ele morre na banheira, em 33.
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Gustavo Capanema, poderoso secretário do Interior, achava que ia ser o sucessor. Virgílio de Melo Franco também. Getúlio deu uma rasteira nos dois e nomeou o jovem Benedito Valadares, que chamou Juscelino Kubitschek para chefe de gabinete.
Foram inaugurar um retrato de Maciel. Acabada a solenidade, saíram no mesmo carro Benedito, Juscelino e Capanema. Capanema, intelectual, culto, vaidoso, irado por não ter sido nomeado, começou a agredir Benedito com uma aula de como governar:
– Olha, Benedito, governo é cultura. Você tem que esquecer Pará de Minas e ver que agora você é o chefe político de Minas. Tem que cercar-se de intelectuais, ler, estudar, para poder estar à altura de governar Minas.
Benedito foi ficando vermelho, furioso, perdeu a paciência: – Olha, Capanema, nada disso. Se suas lições prestassem, você é quem teria sido nomeado pelo presidente Vargas. Governar não é nada disso que você disse. Esse negócio de cultura é para intelectual. Governar é ação, é trabalho. E é isso o que vou fazer. Não vou ler nem estudar coisa nenhuma. Aliás, tenho lá em casa uns cinco ou seis livros e vou jogar tudo fora.
Anos depois, Juscelino relembrava essa historia para seu oficial de gabinete na Presidência, Antônio Carlos Sá, e dava gargalhadas. Aliás, Benedito fez exatamente o que Capanema recomendou: cercou-se da maioria das melhores cabeças de Minas (Orosimbo Nonato, Mario Casassanta, Cristiano Martins, Ciro dos Anjos, outros) e até deixou alguns bons livros : “Esperidião”, “A Lua Caiu”, “Tempos Idos e Vividos”.
E mandou em Minas exatamente doze anos: de 33 a 45.
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Benedito chegou a Curvelo, Minas Gerais, para visitar a exposição de gado do município. Na hora do discurso, atrapalhou-se: – Quero dizer aos fazendeiros aqui reunidos que já determinei à Caixa Econômica e aos bancos do Estado a concessão de empréstimo agrícolas a prazos curtos e juros longos.
Lá do povo, alguém corrigiu: – É o contrário, governador!
– Desde que o dinheiro venha, os pronomes não têm importância.
E continuou. Estava conversando com Ciro dos Anjos, deu sono:
– Ciro, vou dormir. Vou entregar-me aos braços de Orfeu.
– Faltou um M, doutor Benedito.
– Não faltou, não, Ciro, Orfeom é um instrumento musical. Eu estou é com sono mesmo.
E foi dormir.
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Pesquisa ferroviária em Minas, na antiga Rede Mineira de Viação, apurou que o vagão mais atingido nos desastres era sempre o último. Benedito, interventor, recebeu o estudo, leu, chamou Ciro dos Anjos:
– Prepare um decreto suprimindo o último vagão.
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Gustavo Capanema, ministro da Educação de Getúlio, encontra-se com Benedito Valadares, interventor de Minas, na ante sala do gabinete do presidente. Benedito estava com os olhos inflamados:
– O que é isso, Benedito, nos seus olhos?
– O médico me disse que é conjuntivite na vista.
– Conjuntivite na vista não, Benedito. Isso é pleonasmo.
Getúlio chamou, Benedito entrou:
– O que é isso nos seus olhos, governador?
Agora estou na dúvida, presidente. O médico, lá em Belo Horizonte, tinha dito que era conjuntivite na vista. Mas o Capanema, que é muito inteligente, acaba de me dizer, aí fora, que não é não; que é pleonasmo.
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Cada tempo tem suas histórias, cheias de sutilezas e lições. O competente jornalista e professor Rosental Calmon Alves, dizia em um seminário no Globo sobre o futuro do jornalismo: – “Agora, o jornal não vai mais ser apenas jornal. Pode se expandir para outras formas de comunicação com o leitor, desde que perceba que seu negócio é contar histórias. Sempre fomos contadores de histórias. Só que agora, com a internet e os blogs, podemos fazer isso de forma mais ampla”.
Leitores sempre me perguntam porque conto tantas histórias. Exatamente pela razão do que Rosental falou: ligar o passado ao presente.

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