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Fortaleza

Perguntas que não querem – e não vão – calar

Por que mais de 47 mil crianças vivem em instituições no Brasil?
Por que, sendo eles mais de 47 mil, apenas menos de sete mil estão juridicamente aptas a serem adotadas?
O que estão esperando as demais 40 mil crianças e adolescentes? Que o tempo lhes escorra entre os dedos sem a esperança de um afago?
Quem tem o dever de velar efetivamente pelo direito que a criança tem de viver em família? Por que falha?
Quantas oportunidades devem ser dadas a uma família que não cuida de sua criança? Quanto tempo se pode esperar pela aprumação de um adulto, enquanto a criança espera numa instituição? De quem é a prioridade, de verdade, na prática do que é feito?
Quais as consequências de se crescer sem uma família? O que se perde para sempre? O que se consuma pela falta do abraço, do beijo, do cheiro? Como se justifica que uma criança não tenha todas essas coisas o tempo inteiro de sua infância?
Por que não são noticiados esses abandonos como o mesmo escândalo que ocorre na mídia quando há uma suposta adoção ilegal? Por que as crianças de Monte Santo foram devolvidas para sua família biológica para serem negligenciadas por mais uma longa temporada? Alguém vai pagar a dor da separação delas de suas famílias adotivas? Por que voltaram para famílias adotivas? É porque eram desde sempre a melhor solução? Foi só um trauma estúpido e inútil? E a mídia, por que se calou após a elucidação das coisas? Onde está o “desculpe a nossa falha”? Por que há outros Montes Santos Brasil à fora?
Por que toda vez que se tenta uma modificação legal para facilitar a adoção emerge do mar da demagogia o velho monstro do biologismo? Por que ele se traveste de progressismo, de defesa dos pobres, de direito humano bissexto?
Por que existem abrigos fechados, como presídios infantis de inocentes? Por que a sociedade não pode visitá-los, todos? Do que exatamente se está protegendo a criança institucionalizada quando se alega a proteção de sua imagem? Por que há segredo de justiça em relação a seu abandono? Como alguém vai adotar ou apadrinha uma criança que não pode ser vista, que é um número, que é um monte de iniciai com pontos? Quem controla as instituições jurídicas se quase ninguém pode saber o que ocorre com os processos de cada criança?
Qual a dificuldade dos operadores do direito com a adoção? Será que têm algum preconceito com este vínculo? Ou será que a dificuldade é enfrentar a desvinculação da criança de sua família de origem? Será que a praxe é se atribuir à pobreza o que é descuido e desleixo? Será que há medo de se errar contra o adulto e é necessário que a criança seja traumatizada pelo abandono, pela violência, para que finalmente se decida que ele tem direito à uma família amorosa? Por que nunca se erra a favor da criança?
O que acontece nos processos de acompanhamento da institucionalização da criança? O que acontece entre uma audiência concentrada e outra? Por que o Ministério Público não instaura um inquérito civil para investigar o abandono de cada criança, um por criança? Será que a atenção sobre as políticas públicas mais genéricas o fez esquecer do cuidado de cada pessoinha? É papel de quem? Do juiz? Do conselho tutelar? Da secretaria de assistência social? Da rede de proteção? De todo mundo e de ninguém ao mesmo tempo?
Como não lutar contra esse macro abandono? Como se olvidar dos olhos pedintes de carinho, das frontes desiludidas pelo descaso, pelo desamor? Como se admitir como corriqueiro que uma só criança esteja institucionalizada? Como se pode ignorar que o direito à família é um mandamento a ser cumprido, que há uma Constituição que o estabelece sem ressalvas? Como se podem buscar justificativas para a permanência de crianças em instituições quando se sabe que seu lugar é em família?
Qual o preço que esta geração terá que pagar para romper com a demagogia, para desmascarar os que fingem defender a criança, mas desejam com mais intensidade construir carreiras respeitáveis, assegurar posições nos governos, atrair investidores para suas organizações?
Como se esquecer do amor, em fim, esse amor que restitui a coragem de mudar o mundo, de enfrentar as resistências, as ameaças que são feitas a quem aponta as falhas das instituições, a quem questiona os doutos inquestionáveis? Como esquecer esse amor combustível que mantém de pé os que não se conformam e não se rendem? Como não perceber que é o amor a fonte desta luta, amor que falta na vida de quem mais precisa, de quem quer um beijo, uma aprovação de pai ou de mão, quer uma bronca na traquinagem, quer uma beirada de cama de pai depois do pesadelo? Como esquecer desse e de todos os amores?

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