Para o Direito, adotar significa a criação de um vínculo jurídico de filiação. É o ato jurídico complexo que gera laços de paternidade e filiação entre pessoas que não possuem esta relação naturalmente. O estado de filho, que é atribuído automaticamente aos genitores biológicos, segundo as regras e presunções do direito de família, pode ser adquirido por quem, não tendo sido gerado pelo adotante, é por ele adotado, isto é, tido e havido juridicamente como filho, para todos os efeitos. Assim, o filho adotivo é filho de pleno direito, usufruindo de todos os direitos e deveres inerentes a esta condição. A partir de um processo judicial se estabelece uma nova situação jurídica que outorga a um (ou uns) o poder familiar (ou poder parental) e a outro o estatuto jurídico de filho.
Tal descrição, importantíssima, não é suficiente para dar conta de todo o significado da adoção. A limitação se verifica por ter tal definição o escopo de, tão somente, referir o que a adoção provoca na ordem jurídica, sendo fundamental para deslindar quais direitos e deveres decorrem do estabelecimento deste vínculo, mas sem o alcance da essência pessoal posta em marcha para sua realização. A marcha dos afetos humanos, que justificam a existência da proteção jurídica, sendo o principal móvel da adoção, são motivadores da formação de tais vínculos e carecedores dos cuidados estatais.
Com efeito, é no campo da afetividade que reside a principal estrutura da adoção atualmente, devendo a ordem jurídica e as políticas públicas tratarem estas delicadas manifestações da nossa humanidade com prioridade, mormente quando se trata de criança ou adolescente. Superando-se o conceito jurídico, pode-se compreender a adoção como “o ato voluntário (…), calcado no afeto e afinidade, que permite a aceitação de alguém como filho(a), para lhe conceder toda a assistência material e moral, cercadas de proteção, cuidado, zelo, sustento, educação e amor”, nas felizes palavras de Guilherme de Souza Nucci (Estatuto da criança e do adolescente comentado, Rio de Janeiro, GEN/Forense, p. 118). É a primazia do essencial sobre o estrutural, já que o âmago da atitude adotiva é o amor posto em uso, a serviço do outro, a se transformar em cuidado efetivo e afetivo.
Portanto, quando a norma jurídica se debruça sobre essa relação humana deve sempre reconhecer, assim como o seu intérprete, que os bem jurídicos tutelados pelas regras da adoção e de seus processos correlatos, são os afetos humanos essenciais para garantia do acesso à felicidade, principalmente ao que é destinado às crianças e aos adolescentes, para os quais significa uma poderosa argamassa para sua formação sadia e equilibrada. É o amor que deve ser defendido, protegido e permitido. Sua ausência, por outro lado, deve ser combatida, superada e suprida. Essa compreensão fundamental precisa ser reforçada para que as crianças que vivem hoje em instituições tenham alguma chance de viver em família.