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A porno-salada e as crianças-sentimento

A sociedade brasileira tem sido bombardeada com doses maciças de erotismo e futilidade pelos meios de comunicação de massa. Banalidades em programas “realísticos” – os denominados “reality shows” – são lançados nos lares, com grande sensacionalismo, provocando a mobilização de parte significativa da população em torno da convivência de jovens isolados numa casa, tratando de assuntos pueris e nada edificantes. Após o encerramento do “jogo”, naturalmente, as moças são convidadas para posar em revistas masculinas e os rapazes viram subcelebridades em programas de auditório. É a coroação da via fácil ao “estrelato”, vendido como o circo à plebe, incentivada ao gosto da lascívia secreta e provocada pela indiscrição e bisbilhotice.

Mas há manifestações mais explícitas de erotização pela vulgaridade: o apelo à banalização do sexo com a aparição de pessoas com apelidos de vegetais, para ressaltar alguma característica física do seu corpo ou comportamento. Nesta nova vertente surgiram personagens batizados com os sugestivos nomes de “homem beringela”, “mulher melancia”, “mulher samambaia”, “mulher mamão”, “garota moranguinho”, entre outras denominações. É a porno salada brasileira, ao gosto das revistas e dos programas televisivos que apostam no marketing da semipornografia para obter audiência e lucro.
Longe de qualquer moralismo, o que não se pode perder é a consciência crítica sobre nosso comportamento, como seres humanos em busca da realização plena. Talvez os valores realmente importantes, que terão a capacidade de nos trazer paz de espírito e felicidade, não possam ser encontrados neste self-service sexual, virtual ou real. É possível que esta sexualização massificada seja mais uma forma cruel de alienação da população.

Como a mente humana não tem limites, imaginei se a estratégia de apelidar as pessoas com nomes de vegetais, para vendê-las como produtos eróticos, poderia ser apropriada para fins mais interessantes, do ponto de vista humanístico. Teríamos a oportunidade de trocar as leguminosas por sentimentos e criar figuras reais, que não alcançam nem mesmo a passageira celebridade dos seres produto do sexo.
Com esta adaptação, poderíamos encontrar o menino-solidão, abandonado nas instituições de nossa cidade. O menino-solidão, que mora com outros milhares de meninos e meninas-solidão. Tudo que ele quer é encontrar um pai-abraço ou uma mãe-afeto, para ser criado com o cuidado que lhe seja especialmente dirigido, para que possa se transformar num adulto-amor.

Para que esse sonho do menino-solidão possa se concretizar, ele precisa da ajuda de alguns heróis: os poderes transformadores do promotor-dedicação, determinado em não deixar nenhuma criança sem família, podem fazer total diferença na vida deste menino. Além disso, o juiz-coragem, que não se detém diante da demagogia e das dificuldades, responsável pelo destino do menino, opta pela solução de mais amor. Neste exercício de imaginação, estes heróis não vivem encastelados em gabinetes, mas são presentes nos abrigos para tratar da realidade que ali existe, diretamente.
Na vida real, conheço alguns heróis assim. Se todos os que têm a mesma missão tivessem seu comportamento vigoroso e independente, ao invés de termos uma justiça-lentidão-injusta, poderíamos comemorar uma justiça-garantia-efetiva-de-direitos para todas as crianças-sentimento.

Para que se tenha uma sociedade mais justa é necessário, em primeiro lugar, recolocarmos a ordem de prioridades em seu devido lugar: proteger a infância para além dos discursos contundentes. Assim, se faz mister que se proceda uma análise crítica do sistema montado para defender a convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes. O que falta para que a realidade seja tão dura?

Uma vertente de pensamento que começa a tomar corpo é a que pretende estudar o cuidado como um valor jurídico. A valorização do ato de cuidar de outrem é uma resposta madura da Ordem Jurídica à necessidade de solução de conflitos de natureza familiar, principalmente quando o “credor” do cuidado seja criança ou adolescente.

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