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Jango em Paris

RIO – Faz 40 anos, neste setembro de 2016. Em 1976, acabada a Constituinte portuguesa (quando escrevi “Portugal, Um Salto no Escuro”, para a Francisco Alves), com vitória ao Partido Socialista, de Mário Soares, iria começar a da Espanha.Viajei pela “IstoÉ” e “Correio Braziliense”.
Antes dos comícios da Espanha, fui passar duas semanas em Paris e soube que o ex-presidente João Goulart estava na cidade, cuidando do sofrido e alquebrado coração. Estava hospedado no Hotel Claridge (Champs Élysées, 74). Fui lá deixar-lhe um cartão com um abraço brasileiro. Saindo do hotel, encontrei o Carlos Castello Branco, do “Jornal do Brasil”, que fora conversar com ele. Estava preocupado: — O Jango não está bem, muito pálido e inconformado com o exílio.
Deixei um bilhete, com o telefone do hotel onde estava hospedado (o “Argentine”, ao lado do Arco do Triunfo). No dia seguinte, um recado do Presidente. Esperava-me para uma conversa. Conversamos horas. O Castelinho tinha razão. A ditadura militar estava assassinando Jango.

Hitler Talvez eu tenha sido inábil ao lembrar-lhe a história rocambolesca do hotel dele. O “Claridge”, onde tantas vezes me hospedei, quando era no máximo de 200 dólares a diária, faz parte da História cultural, política e militar de Paris. Nele viveram artistas, escritores e generais alemães. Colette, a dama das letras, morou lá, como o cantor Maurice Chevalier.Quando Hitler invadiu Paris, em 1940, o marechal Von Rundstedt, com seu ajudante de ordem, o coronel Paulus, ocupou a suíte central, a mais bonita.
Finda a guerra, o diretor M Machenaud, serviçal e puxa-saco, foi preso e executado pelas tropas de De Gaulle. Em agosto de 45, os nazistas derrotados foram substituídos por gente melhor, como Marlene Dietrich e Jean Gabin, a divina Edith Piaf,o automobilista argentino Manoel Fangio, Evita e Juan Perón, Ella Fitzgerald, Scott Fitzgerald, o poeta Ezra Pound, o cantor Ray Charles, a atriz Janie Mansfeld, o ator Curd Jurgens, o cineasta Luis Buñuel, de novo Perón em 73, já agora com sua Izabelita. E Pavarotti. Jango espichava a dura perna direita, olhava os móveis e cortinas do bar, bebia mais um uísque, ficava calado e infinitamente triste. Ia morrer.
Voltei ao Brasil lendo a excelente biografia de João Goulart, bem documentada e sobretudo verdadeira, do professor e historiador Jorge Ferreira da Universidade Federal Fluminense e pesquisador do CNPQ.Não era novidade para quem conhecia suas exemplares e convincentes pesquisas sobre o trabalhismo brasileiro: “O Imaginário Trabalhista – Getulismo, PTB e Cultura Política Popular”, “Prisioneiros do Mito – Cultura e Imaginário Político dos Comunistas no Brasil”, “O Populismo e sua Historia”.
Jango viajara para a Europa para fugir das ameaças que passara a sofrer na Argentina e tomar providências para encontrar uma residência em Paris, onde residiria até o retorno ao Brasil.

Exílio
Em Paris, Jango encontrou-se com Abelardo Jurema e José Gomes Talarico, a quem pediu que procurasse Mário Soares para agradecer-lhe o convite para ir a Portugal. Não deveria aceitar, pelo constrangimento que causaria ao líder português, no início do mandato.
Mas, pedia que ele regularizasse a situação dos exilados brasileiros . Mário Soares manifestara preocupação com Brizola, vivendo sob a ditadura uruguaia. E sugeriu que ele fosse para Portugal. Brizola foi. O médico suíço concluiu que o coração de Jango era frágil como o de um homem de 80 anos, quando, na época, tinha 56.O médico francês disse que sem perder peso e parar de fumar a Medicina nada poderia fazer :
— “Monsieur President, si on ne veut pas vivre, on ne vit pas.” (“Senhor Presidente, se não se quer viver, não se vive”)
Negava-se a parar de fumar. Escreveu para Cláudio Braga:
— “Estou concluindo exames com resultados bem razoáveis, especialmente considerando que não me sujeito a prescrições”.
Em dezembro de 76, Jango morria numa fazenda na Argentina. Por mais que fuçassem sua vida, os militares brasileiros e americanos nada encontraram para denunciá-lo. Seus ministros da Fazenda eram Moreira Sales e Santiago Dantas. Não eram o prisioneiro Mantega.

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