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Fortaleza

Existem êxitos que dão certo de outra forma

Gylmar Chaves
Especial Para O Estado

Cristiana Maria Cabral Figueiredo é uma moça cheia de beleza, extrovertida, fisioterapeuta que ama a profissão, proveniente da cidade do Baturité.

Ela reside num apartamento de onde podemos apreciar os aviões realizando a aproximação para o pouso no Pinto Martins. Com destreza, ela se movimenta por toda a sala, e abre a cortina cor do creme para deixa-la em conexão com o vento. Neste simpático ambiente está uma mesinha própria para criança com uma cadeirinha alegre. Cristiana é mulher de mínimos detalhes!

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Despertada para a adoção por um caminho que deu certo de outra forma, já trabalhava trabalhar com bebês prematuros na Maternidade Escola Assis Chateaubriand, quando se deparou com o fato de uma mãe ter concedido à luz a uma criança, e tê-la abandonada logo no outro dia.

Saulo nascera extremamente belo, e todos do hospital ficaram apaixonados por ele, o que deixou Cristiana apavorada, pois à cada dia um desejo incontrolável de ser mãe se apoderou dela: “Eu estava solteira e a partir daquele momento se desenvolveu em mim a vontade corrente de ter um bebê… De adotar um bebê… e eu passei a ter medo da possibilidade de alguém também se interessar por ele.”

Numa manhã, ao sair de casa, Cristiana teve o ímpeto de se dirigir ao Fórum para se indagar a respeito dos processos de adoção: “O promotor me disse que inicialmente eu teria de fazer um cadastro, e que o referido bebê sairia da maternidade direto para o abrigo”.

Cristiana não se conteve. Uma tristeza se abateu sobre ela acompanhada de intenso choro. Como jamais foi de desistir de algo em sua vida, resolveu ir à luta. Nesse caminho surgiu em seu sentimento o desejo possível de reintegrá-lo a família, e, se caso não conseguisse, tornar-se sua mãe adotiva: “Ao encontrar o pai do Saulo, ele me disse que não tinha mais contato com a mãe… Mas, eu senti algo estranho, como se estivesse omitindo alguma preciosa informação”.

Na verdade, a mãe de Saulo, que à época tinha 22 anos, morava com os pais no município de Itapiúna quando se descobriu grávida. Usando de todos os artifícios para esconder a gestação, ao completar sete meses viajou para Fortaleza a fim de ter o bebê às escondidas.

No dia que Cristiana foi se encontrar com o pai do Saulo, levara uma foto dele com a intenção de sensibilizá-lo. O que algum tempo depois acabou sendo o elo de religação com a família: “Ele me ligou pedindo a minha ajuda, pois a mãe viu a foto e ficou muito angustiada, pedindo por tudo que fosse feito alguma coisa para reavê-lo”.

Dissera ainda o pai de Saulo, que o avô desejoso de criar o neto dele tomara partido da filha, e mandou recado para saber como poderia ajudar para isso acontecer, desconstruindo desse modo a possibilidade de Cristiana adotá-lo, conforme concordara durante o primeiro encontro.

Certamente o avô de Saulo sabia a dimensão que causaria seu pedido. Em contato com a mãe, Cristiana a aconselhou que viesse para Fortaleza o mais rápido possível, mesmo porque a criança estava internada pela segunda vez com problemas respiratórios em um hospital pediátrico.

Juntos, os três se dirigiram ao Fórum a fim de se informarem como funcionava o processo de reintegração familiar. E em seguida, para a Casa Abrigo: “Mãe e filho é uma questão de vínculo. Mesmo o filho sendo biológico e a mãe não se dedicar a ele por meio do contato físico, aconchegar, o vínculo pode ser perdido”.

Nos primeiros instantes, mãe de Saulo ficou observando de longe, esboçando está feliz, embora não demonstrasse aquela emoção intrínseca que há entre mãe e filho: “Ela pegava o bebe e me entregava na mesma hora. Aí eu dizia, ele é seu…”.

Três vezes por semana, Cristiana a levava para visita-lo. Numa das vezes, obteve a orientação da Assistente Social que ele poderia ser registrado, mesmo que esse ato não confirmasse ainda a restituição familiar definitiva.

Após um mês recebendo a visita da mãe, Saulo contraiu outra pneumonia e precisou de internação, a terceira desde que nascera.

Com a mãe bastante assustada, Cristiana sempre cheia de ímpeto foi ao Fórum conversar com a Defensora, pedir para ela acelerar o processo, pois os pais estavam querendo o filho de volta, e que ela os conhecia, e que a mãe residente no interior do Estado estava encontrando dificuldades em permanecer na capital. “A Defensora disse que a solução seria os avós pedirem a guarda temporária da criança, que o Fórum concede por mais ou menos por seis meses. Somente depois de ser constatada a adaptação os pais ganhariam a guarda definitiva. Que esperassem, pois entraria em contato com a Conselheira Tutelar da cidade onde residiam”.

Em poucos dias os avós de Saulo reafirmaram o desejo de acolherem a criança: “Eu também telefonei para a Conselheira Tutelar de Itapiúna e pedi para ela acelerar o processo e viesse com os avós para receberem a guarda temporária. Na verdade, eu tinha receio dele ir a óbito, pois já estava se tornando frequente a pneumonia…”

Para Cristiana a emoção ao presenciar o recebimento do documento da guarda temporária recompensou todas as tristezas. Ainda mais com o convite para ser madrinha: “Não me tornei a mãe dele, no entanto fiquei sendo considerada uma pessoa da família”.
Saulo se foi, mas, Cristiana não desistiu de ser mãe…

Uma vida traz outra vida
“A gente inicialmente preenche uma ficha com todos os dados, escolhendo o perfil da criança que quer adotar. O meu desejo era que tivesse até um ano, independente do sexo e cor. E, caso portasse algum problema de saúde, que fosse resolvido”.

Numa de suas férias, Cristiana se encontrava em Porto de Galinhas, quando a psicóloga do Fórum telefonou informando de haver uma criança que preenchia os requisitos em termos de perfil por ela indicado. Tinha o nome de Pedro, e perguntou se ela desejava conhece-lo. “Eu desliguei o telefone muito emocionada, completamente entregue ao choro. Na verdade não estava mais esperando tanto por essa oportunidade de adotar uma criança”.

E como Deus sempre coloca tudo no verdadeiro lugar, nesse mesmo dia, uma amiga de Cristiana, que não tinha conhecimento sobre o seu desejo de adotar uma criança, postou uma citação bíblica via Instagram: “Não temas, porque eu sou contigo; não te assustes”. Isaias, 41:10.
Ao ler esse versículo Cristiana sentira a sensação que Deus estava tentando lhe dizer: “Eu Sou mãe contigo. Eu Sou pai contigo”.

A mãe de Pedro era usuária de craque e também o abandonara em um hospital. Estava ali na Casa de Jeremias desde os dois meses, e já se passara mais de um ano e oito meses para ser liberado e se iniciar o processo de adoção.

“Na realidade, ele não mexeu comigo. Cheguei a sentir que ainda não era a minha criança. Ele tinha uma estética física completamente contrária ao que imaginara, mas, um pensamento forte me tomou: Meu Deus, porque vou abandonar essa criança da possibilidade de ter uma segunda mãe?”
Na segunda vez que fui visita-lo já me senti conquistada: “Ele passou suas mãozinhas no meu rosto e depois alisou meu cabelo com bastante meiguice, me causando muita emoção com aquele gesto de carinho”.

Depois da terceira vez que saíram juntos, Pedro passou a dar escândalo quando Cristiana demonstrava chegado o momento de irem embora. Esse comportamento mexia muito com ela, que passou a sair do abrigo somente depois que ele pegava no sono.

As segundas-feiras sempre chegam, e passados dois meses e meio, ocorreu o primeiro final de semana juntos, quando o escândalo de Pedro ao se despedir de Cristiana foi ainda maior: “Inconsolável nos braços da cuidadora, essa cena mexeu muito comigo, e só me atiçou a vontade de ir conversar com a psicóloga do Fórum”.

Sempre movida por seu ímpeto, logo ao chegar à Maternidade Escola Assis Chateaubriand, ligou para a psicóloga do Fórum e disse que iria entrar com o pedido de guarda temporária, mesmo que ela achasse sua decisão precoce, ou que colocasse no relatório: “Não desejava mais ver meu filho se sentir rejeitado, e repleto de insegurança”.

A psicóloga, depois de ouvi-la fez outra proposta. Sinalizou que passasse mais um mês levando Pedro todos os finais de semana para sua casa, para continuar observando o comportamento dele. Cristiana não aceitou. Disse com todas as forças do meu coração materno do sofrimento que seu filho estava passando. “Que não aguentava mais…”

A decisão
Tudo parecia sem fim. Então, Cristiana foi firme em afirmar que com ou sem concordância entraria com o pedido.

Nesse mesmo dia, a Psicóloga e a Assistente Social da Casa de Jeremias disseram-na que a apoiariam: “A gente envia um relatório sobre a formação do vínculo mãe-filho”.

Duas semanas depois saiu o resultado positivo da solicitação. E Pedro se despediu da Casa de Jeremias.
O primeiro mês foi muito difícil para Cristiana e para o pequeno Pedro. Ele não queria sair um só instante dos braços dela. Acordava muito pela madrugada, chorando, como se estivesse transmitindo certa insegurança. Consequentemente, jamais deixou de demonstrar carinho. “Ele gosta de cantar, de dançar, e uma das coisas que mais me chama a atenção é o avanço dele na parte motora, da percepção, e da linguagem. Hoje ele fala, às vezes fala até demais”.

Pedro ensinou a sua mãe sobre a importância incondicional do carinho, que produz o amor, mudanças infinitas…

Um belo dia, Pedro e o Saulo se conheceram. E os dois se mostraram nitidamente enciumados e disputaram os espaços mais lúdicos da casa, os brinquedos, os afetos maternos…
Mas, Pedro já ensinara a mãe a ser carinhosa até nos momentos mais difíceis que a vida impõe, e também a fazê-la perceber que o amor pelos filhos a tudo transcende.
 

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