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Adoção é uma forma natural e concreta de combater o abandono

Em 2008, O Estado do Ceará teve um acréscimo de 31 adoções com relação ao mesmo período de 2007. Esse ano foram realizadas 50 adoções, enquanto que no ano passado foram apenas 19. Apesar da situação está longe do ideal, essa evolução deve-se ao trabalho árduo de poucas pessoas que ainda se preocupam com a situação de crianças que vivem em abrigos, precisando de um lar e do convívio afetivo e educacional que só é possível dentro de uma família. Com 34 anos de magistratura, o juiz Suenon Bastos, com certeza, é uma dessas pessoas. Sempre ligado ao tema da infância, ele mostra intimidade sobre o assunto sempre que abordado. Como Coordenador do Juizado da Infância e Juventude desde fevereiro de 2008, Suenon Bastos comemora os avanços e o aumento dos números de adoções realizadas nesse ano. Em clima natalino, o juiz concedeu uma entrevista exclusiva para o jornal O Estado, onde comenta sobre a solidariedade e afirma que adoção é um ato de amor. Também foi abordado durante a entrevista temas como a carreira de magistratura, a importâncias de campanhas como a realizada pelo jornal O Estado e, principalmente, sobre os entraves para a efetivação dos direitos da criança e do adolescente no Ceará.

[O Estado] Crianças que moram em abrigos dependem muito da ação rápida dos juízes. Como o senhor sente essa responsabilidade?
[Suenon Bastos] Estou há 19 anos como Juiz da Infância. Faço um trabalho de motivar as pessoas que querem adotar. Como coordenador me sinto extremante responsável pelo destino de inúmeras crianças abrigadas no Ceará. A responsabilidade do Estado é muito grande e preocupante, visto que é direito fundamental de toda criança e adolescente a convivência familiar e comunitária. O Juizado está com duas equipes técnicas que trabalham constantemente para garantir que o abrigamento tenha caráter provisório.

[O E.] Mas esse caráter provisório não vem sendo cumprido, apesar de está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (Eca)?
[S. B.] Temos tentado garantir que as crianças e adolescentes fiquem cada vez menos tempo em abrigos. Infelizmente, nem todos têm seu destino decidido de modo ágil. Muitas vezes demora-se para decidir a situação e a criança fica vulnerável dentro do abrigo. É muito variável o tempo que cada um fica em abrigamento, não temos uma média de tempo. O prejuízo do abrigamento é muito grande e irreparável.

[O E.] Quais são os principais entraves para adoção no Ceará?
[S. B.] O que mais dificulta que crianças saiam dos abrigos e tenham um lar é a questão do perfil. Infelizmente, muitos pretendentes ainda têm um perfil muito limitado e fazem opção por crianças recém-nascidas, de cor de pele branca e que sejam meninas. Todo esse condicionamento dificulta a colocação das crianças em família substituta e a situação de abrigamento vai se postergando por anos.

[O E.] No ano de 2008, quantos abrigos o senhor visitou?
[S. B.] Tenho visitado alguns abrigos. Fui ao abrigo Tia Júlia mais de uma vez em 2008. Temos nos organizado para acompanhar sempre de perto toda a rotina dos abrigos da cidade.

[O E.] O que mais lhe chamou atenção nessas visitas?
[S. B.] O que mais tem me chamado atenção nas visitas que fiz aos abrigos foi a quantidade de crianças e adolescentes que estão fora do perfil desejado. A idade avançada dos abrigados faz com que fique cada vez mais difícil conseguir um lar. Nas visitas sempre me emociono, pois trabalhamos dia e noite para tentar agilizar os processos e garantir mais dignidade para as crianças e adolescentes abrigadas.

[O E.] O Jornal O Estado lançou, em dezembro, a Campanha de apoio à adoção. Qual a importância de Campanhas como essa e a como a sociedade civil pode ajudar?
[S. B.] Dou meus parabéns à iniciativa do Jornal O Estado em promover uma Campanha sobre adoção. É muito importante para a sociedade refletir sobre a situação de inúmeras crianças e adolescentes em todo o país. As Campanhas despertam as pessoas para a problemática e tocam o coração de muita gente que quer adotar. Assim, como o trabalho da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), com a Campanha Mude um destino, o Jornal O Estado está tendo uma ação muito válida que merece ser prestigiada.

[O E.] Quais as limitações para visitação de um abrigo e, esses limites, podem isolar ainda mais as crianças da sociedade?
[S. B.] Nem todo mundo que está inscrito pode visitar abrigos. Há que se respeitar um fila de acordo com o tempo de cadastro. Temos que preservar os meninos para que eles não sejam expostos como mercadorias. A nossa prioridade não é o desejo do casal, mas sim a realização da criança.

[O E.] Qual é a responsabilidade dos estados e da federação com as crianças abrigadas?
[S. B.] O Estado tem que tomar conta de todos os meninos e meninas abrigados. Ele tem feito a sua parte em garantir a criança como prioridade absoluta. Apesar de sabermos que há muito que se melhorar, principalmente, no que se refere a garantia de políticas públicas para a família, específicas para a área de geração de renda, saúde e educação. Temos que cuidar das crianças enquanto elas ainda estiveram em suas famílias originais. A Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Eca) estabelecem que é dever da Família, do Estado e da sociedade cuidar da infância e da adolescência.
 

[O E.] Existe, dentro do Juizado, alguma equipe que fiscalize a integridade física e psicológica das crianças abrigadas?
[S. B.] Temos uma equipe interdisciplinar que está disponível para cuidar de todas as crianças e adolescentes abrigadas. Os assistentes sociais e psicólogos são preparadas para cuidar de todos, sem descriminação.

[O E.] Sabemos que muitas crianças completam maioridade nos abrigos. Quando isso ocorre, qual o procedimento, para onde elas vão?
[S. B.] Como os pretendentes não querem filhos fora do perfil desejado, muitas crianças e adolescentes ficam nos abrigos até a maioridade. O Governo do Estado tem que se responsabilizar em garantir a colocação do jovem no mercado de trabalho e oferecer cursos profissionalizantes. Nem todos os adolescentes que saem de abrigos conseguem ter êxito, pois não foram bem preparados na destituição.

[O E.] Durante todos esses anos de magistratura, o que foi mais gratificante?
[S. B.] O mais gratificante desses meus anos de profissão é a possibilidade de poder fazer o bem e de garantir a realização principalmente das crianças e adolescentes. Elas sonham em ter uma família. Quando conseguem, é gratificante.

[O E.] O que é adoção para o senhor?
[S. B.] É um ato de amor. Adoção é uma forma natural e concreta de combater o abandono. Ela recria a família para a criança que perdeu a sua origem e atribui condição de filho, com os mesmos direitos e deveres.

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