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Fortaleza

Assim caminha a humanidade

 

1 – Meneses Pimentel, professor de Direito Romano e Filosofia do Direito, governador (1935 a 1937), interventor (1937 a 1945), deputado (1951 a 1955), ministro da Justiça (1955 a 1956), senador (1959 a 1971), foi tudo no Ceará.
Era interventor, chegou ao Palácio do Catete a noticia de que tinha sido baleado em Fortaleza. Lourival Fontes, chefe da Casa Civil de Getulio, telegrafou a Brasil Pinheiro, chefe da Casa Civil de Pimentel:
– Informe urgente se governador Meneses Pimentel foi alvejado.
Brasil Pinheiro informou urgente:
– Não. Continua preto.
Meneses Pimentel era mulato retinto.
2 – Ageu de Castro, coronel de muitas terras e importâncias, era deputado estadual pela região de Sousa, na Paraíba. O coronel era inteligente e rude, grosso e racista. Em João Pessoa, foi ao palácio falar com o governador Pedro Gondim. O oficial de gabinete, negro, não o conhecia, perguntou qual era o assunto. O coronel explodiu:
– Como é sua graça?
– Marilake Toscano.
– Negro, Marilake é nome de artista de cinema. De hoje em diante, seu nome é Benedito. Be-ne-di-to, ouviu?
Meteu a mão na porta e entrou.
3 – O poeta português Julio Dantas (“A Ceia dos Cardeais”) veio ao Brasil, foi a Belo Horizonte. O prefeito (1947 a 1951) era Otacílio Negrão de Lima, irmão de Francisco Negrão de Lima. Estavam lá as autoridades. Não conhecia ninguém. Sabia apenas o nome do prefeito, Doutor Negrão.
Olhou para um lado, olhou para o outro, abriu os braços e foi em direção ao cordão das autoridades:
– Doutor Negrão, meu abraço.
E abraçou o senador Melo Viana, mulato queimado, quase negro.
4 – Milton Santos, o saudoso jornalista, professor, poderoso intelectual (ganhou o Nobel de Geografia), morava no mesmo edifício e andar em que eu morava (o Napoli, na Barra, em Salvador). No golpe de 1964, fomos presos.
Editorialista de “A Tarde”, o jornal mandou o veterano e respeitado secretário da redação ao quartel. O coronel, de pé, fez um discurso racista:
– Além de subversivo, é um negro importador de putas francesas.
Abriu uma gaveta, puxou uma foto:
– Olhe ele aqui, jantando com duas putas francesas importadas.
Uma das louras era a mulher do Milton. A outra era a mulher do secretário do jornal, que reagiu aos berros. O coronel quase leva um tabefe. O jantar tinha sido na casa do secretário, no aniversário dele.
Mesmo assim, Milton continuou preso. Só foi solto e exilado por interferência do general De Gaulle, presidente da França, junto a Castello Branco, porque o Milton era professor da Universidade de Estrasburgo.
5 – Há meio século, em 1960, acompanhando a campanha de Nixon e Kennedy nos Estados Unidos, eu não compreendia como, em pleno século XX, na maior potência econômica e militar do mundo, os negros não podiam sentar junto dos brancos no metrô, ônibus, trens, restaurantes, até nos bares.
Na minha Bahia, e no Brasil todo, negros e brancos nos sentávamos juntos nos mesmos bancos dos bondes, ônibus, trens, bares e restaurantes.
Também me chocaram os principais argumentos contra John Kennedy: era “católico, liberal e mulherengo”. Ganhou por menos de 1%.
6 – Nos mesmos Estados Unidos, o negro Barack Obama, filho de africano muçulmano do Quênia, criado por um muçulmano, casado com uma negra, com duas filhas negras, candidato do partido de Kennedy, foi eleito presidente dos Estados Unidos de 2009 a 2017, sendo o primeiro afro-americano a ocupar o cargo.
É um acontecimento extraordinário na História da humanidade. Jamais o bicho homem caminhou tanto em tão pouco tempo. A Idade Média e a Inquisição da Igreja Católica duraram mil anos. A escravidão, milhares de anos, desde a China e o Egito. O racismo ainda ronda por aí, mas envergonhado e cada dia mais desmoralizado e rejeitado.
7 – Todo mundo já contou uma do inesquecível Caymmi. Também vou contar a minha. Hélio Fernandes lembrou que ele nasceu no mesmo dia, mês e ano de Carlos Lacerda: 30 de abril de 1914. A mesma genialidade.
Numa tarde de 1990, em Agrigento, na Sicília, diante do céu azul e do mar azul do Mediterrâneo, Jorge Amado começou a lembrar-se da Bahia e me contou uma história dele, de Caymmi e Lacerda, muito interessante.
Muito amigos nos anos 30, depois que Caymmi e Jorge chegaram ao Rio de Janeiro, foram passar um domingo em Paquetá. Com seu inseparável violão, Caymmi começou a dedilhar uma nova musica. Lacerda pegou um papel e escreveu dois versos. Jorge também escreveu mais uns. E pararam aí.
Caymmi concluiu depois. Creio que foi “É Doce Morrer no Mar”.

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