27.8 C
Fortaleza

A prisão do senador líder do Governo

D elcídio Amaral não é um senador qualquer. Sempre sensato, seguro e sereno, pelo menos nas diversas abordagens da imprensa, ao longo de sua carreira política, o senador foi, surpreendentemente, pelo menos para “nosotros”, preso pela Polícia Federal, ontem. Não é uma prisão qualquer. Em pleno exercício do mandato, Delcídio é o líder do governo da presidente Dilma Rousseff em nossa Câmara Alta. Ele é o porta-voz da presidente da República no Senado.

E foi preso, em uma ação referendada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), tendo como decisão inicial a ordem de prisão feita pelo ministro Teori Zavascki, sempre ortodoxo, principalmente, por rezar pela letra fria da lei. A prisão de Delcídio pegou todo mundo de surpresa. Ele é o primeiro senador no exercício do mandato preso desde a promulgação da “Constituição Cidadã”, de 1988. É a decisão do STF vem calçada por a fatos consistentes. O senador teria tentado abortar o processo de delação premiada do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, no escandaloso caso do “Petrolão”, tentando suborná-lo com uma bolsa-ajuda mensal de R$ 50 mil. Um escândalo dentro do outro. Um mensalão particular direcionado a Cerveró [pobre Cerveró, esse pessoal pensou que ia suborná-lo o tempo todo]. Inacreditável. O senador foi pego pelo grampo telefônico em escuta cruzada legal.

Os fatos que tomaram conta do noticiário político de ontem colocaram o Senado em uma sinuca de bico por ter que decidir sobre a continuidade da prisão de um dos seus pares — tendo foro privilegiado, o senador Delcídio deve ter a continuidade de sua prisão aprovada em sessão do Senado. Entretanto, instalou-se um conflito, não sei se conflito de ordem moral ou conflito de ordem legal ou se os dois. O presidente do Senado Renan Calheiros defendeu inicialmente o voto secreto. Isso causou logo espanto em alguns senadores, como em Jarbas Vasconcelos e em Cristovam Buarque que defenderam, na tribuna, o voto aberto. Voto secreto é mais um golpe na imagem do Senado junto à opinião pública. “Nós não temos mais gordura de credibilidade para defender o voto secreto nesta casa” bradou Buarque. O senador cearense José Pimentel, elevado à condição de lider do Governo, defendeu o voto secreto. A prisão do senador Delcídio abre um enorme precedente para as duas casas do Congresso Nacional.

Contra ou favor da manutenção da prisão do senador, teríamos aí uma nova “jurisprudência” que cairia como um enorme manto sobre as duas casas. O sessão do Senado continuará pela noite desta quarta-feira, e certamente, no avançado da hora, a decisão será tomada. Arrisco, agora às 18h30min, quando encerro, um veredito: considerando todas as variáveis de desgaste e de risco de julgamento público negativo e considerando ainda contradizer uma decisão tão grave do STF, tomada por ministro da envergadura conservadora de um Teori Zavaschi, duvido que o Senado se acovarde sob o voto secreto e, sob ele, dê um salvoconduto ao senador preso.

A tese do voto secreto defendida pelo presidente Renan pode estar calçada nesse temor. No temor de que, se um foi preso, outros poderão vir a ser. E esse temor se assenta na mais pura realidade. De fato, o senador Renan tem razão em seu temor. Quebrou-se um “tabu”, aquele de um parlamentar não poderia ser preso em flagrante em pleno exercício de mandato. Libertar o senador Delcídio seria, para o Senado, alinhar-se ao crime cometido por este considerando a consistência das provas que fizeram com que o STF, por unanimidade, decidisse a favor da prisão de Delcídio. É mais um duro golpe para o governo Dilma. É como se um órgão importante do corpo governamental tivesse sido amputado. Mostra um organismo canceroso em que a corrupção — a célula cancerosa — deixa de ser acidental e vira a regra. A questão agora é: a tentativa de Delcídio em tentar subornar o subornável Cerveró foi uma ação individual ou ele foi, mais uma vez, porta-voz?

Luís Sérgio Santos
Jornalista

Mais Lidas

Entenda 2º projeto aprovado da reforma tributária

A proposta aprovada pelos deputados trata das regras do Comitê Gestor do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) de estados e municípios, que será...

Férias

As colônias de férias espalhadas pela cidade tem sido muito procuradas pelas crianças neste mês de julho. São espaços onde o contacto com a...

Delfim Netto e o ‘Milagre Econômico’

Antônio Delfim Netto, economista catedrático e político brasileiro faleceu nesta segunda-feira (12) aos 96 anos. Foi ex-ministro da Fazenda, da Agricultura e do Planejamento,...
spot_img